16 de fevereiro de 2009

Desafiar a crise

A crise económica e financeira que atravessa o mundo traz inevitáveis repercussões nas relações económicas bilaterais, mesmo naquelas cuja solidez havia sido firmada ao longo dos tempos e que assentava, por essa razão, num quadro tradicional de estabilidade e confiança.


Assim, e por muito que gostássemos que tal não viesse a acontecer, há que convir que as ligações luso-francesas – nos domínios comerciais, de investimento ou de turismo – correm hoje riscos de serem afectadas, neste cenário quase global de recessão, que não tem data marcada para a sua atenuação ou desaparição. Num contexto como o que atravessamos, sustentar um discurso de despropositada euforia seria uma atitude algo patética, uma mera negação da realidade. Não contem comigo para isso.


Quero com isto dizer que, chegado a Paris como novo embaixador português, me deparo hoje com um terreno que, à partida, passa a ser diferente daquele que se desenhava de há uns anos para cá, no qual prosperavam as diferentes linhas de crescimento económico.


Perante isto, parece-me óbvio que temos de mudar de runo, porque este estado de coisas, porque é bem diferente, passa a exigir da parte de todos nós novas e talvez muito mais profissionais respostas.


Desde logo, importa “desconstruir” os efeitos que a crise possa estar já a gerar nas diversas dimensões do nosso quadro de relacionamento económico, identificando sectorialmente as razões das mudanças entretanto detectadas e começar a tentar perceber as linhas tendenciais de uma sua possível superação.


Para essa finalidade, conto com poder instituir um quadro de relação muito íntima com os agentes económicos, cuja capacidade de detecção, no terreno, das alterações dos mercados passa a ser da maior importância para todas as estruturas oficiais que enquadram a nossa acção externa. Mais do que nunca, importa-nos ouvir com atenção e vir a retirar do que nos for dito pelos operadores todas as ilacções que possam justificar mudanças de filosofia e acção, no âmbito dos nossos próprios mecanismos de promoção e apoio.


É esse esforço que tenciono potenciar, a muito curto prazo, em íntima ligação com a nossa Câmara de Comércio, emvolvendo quer os agentes económicos portugueses que operam no mercado francês, quer o conjunto dos principais empreendedores franceses que hoje são nossos tradicionais clientes. Fidelizar os clientes tradicionais é a palavra de ordem para a nossa acção comercial em França.


Mas as crises foram sempre, paradoxalmente, um momento para novos sectores encontrarem as suas oportunidades. E porque em Portugal, nos últimos anos, tem vindo a verificar-se a emergência de novas tipologias de empresas, por vezes dedicadas a áreas antes nunca exploradas no quadro da internacionalização económica, marcadas por formas de modernidade e pela adesão a novas e interessantes propostas tecnológicas, queremos contribuir para lhes proporcionar montras de visibilidade no mercado francês. Essa será sempre a melhor forma de tais unidades, quase sempre mobilizadas por gente jovem e ambiciosa, poderem vir a garantir a hipótese de conquista de lugares de futuro no novo tecido de relacionamento económico que vai acabar por afirmar-se no pós-crise.


Falar de novos investimentos, num quadro de recessão, pode parecer uma ideia despropositada nos dias que correm. Mas todos temos de perceber que um país como a França, com uma economia potencial sempre de grande pujança à escala global, mantém uma linha estratégica de afirmação económica externa que tende sempre a ver muito para além da conjuntura.


No passado, Portugal foi um espaço interessante para algum investimento francês, da mesma forma que esses mesmos capitais se revelaram - e continuam a revelar – um factor importante para o nosso próprio tecido económico. É do interesse oficial português continuar o diálogo com os grandes grupos franceses, bem como com PME’s de certos sectores com vocação externa, com vista a sublinhar as vantagens comparativas que o mercado português, como campo de investimento, continuará a proporcionar. Quem já lá actua desenha, aliás, o nosso melhor cartão de visita.


Uma palavra especial para o turismo. Os últimos tempos vinham a definir um interesse crescente da França pelo mercado português, um mercado que é competitivo no preço, acolhedor na oferta e com uma variedade que tem muito a ver com as profundas ligações culturais e de civilização que nos aproximam. Procuraremos que essa tendência se não perca.


Em todas as áreas, em suma, vamos tentar responder à crise com mais trabalho, mais imaginação e maior diversidade de propostas. E o embaixador de Portugal está à plena disposição dos agentes económicos – portugueses ou franceses – para os ajudar a encontrar os melhores caminhos para a concretização dos seus interesses.


Texto publicado no número de Fevereiro de 2009 da revista "Portugal Global" da AICEP

Desafiar a crise

A crise económica e financeira que atravessa o mundo traz inevitáveis repercussões nas relações económicas bilaterais, mesmo naquelas cuja solidez havia sido firmada ao longo dos tempos e que assentava, por essa razão, num quadro tradicional de estabilidade e confiança.

Assim, e por muito que gostássemos que tal não viesse a acontecer, há que convir que as ligações luso-francesas – nos domínios comerciais, de investimento ou de turismo – correm hoje riscos de serem afectadas, neste cenário quase global de recessão, que não tem data marcada para a sua atenuação ou desaparição. Num contexto como o que atravessamos, sustentar um discurso de despropositada euforia seria uma atitude algo patética, uma mera negação da realidade. Não contem comigo para isso.

Quero com isto dizer que, chegado a Paris como novo embaixador português, me deparo hoje com um terreno que, à partida, passa a ser diferente daquele que se desenhava de há uns anos para cá, no qual prosperavam as diferentes linhas de crescimento económico.

Perante isto, parece-me óbvio que temos de mudar de runo, porque este estado de coisas, porque é bem diferente, passa a exigir da parte de todos nós novas e talvez muito mais profissionais respostas.

Desde logo, importa “desconstruir” os efeitos que a crise possa estar já a gerar nas diversas dimensões do nosso quadro de relacionamento económico, identificando sectorialmente as razões das mudanças entretanto detectadas e começar a tentar perceber as linhas tendenciais de uma sua possível superação.

Para essa finalidade, conto com poder instituir um quadro de relação muito íntima com os agentes económicos, cuja capacidade de detecção, no terreno, das alterações dos mercados passa a ser da maior importância para todas as estruturas oficiais que enquadram a nossa acção externa. Mais do que nunca, importa-nos ouvir com atenção e vir a retirar do que nos for dito pelos operadores todas as ilacções que possam justificar mudanças de filosofia e acção, no âmbito dos nossos próprios mecanismos de promoção e apoio.

É esse esforço que tenciono potenciar, a muito curto prazo, em íntima ligação com a nossa Câmara de Comércio, emvolvendo quer os agentes económicos portugueses que operam no mercado francês, quer o conjunto dos principais empreendedores franceses que hoje são nossos tradicionais clientes. Fidelizar os clientes tradicionais é a palavra de ordem para a nossa acção comercial em França.

Mas as crises foram sempre, paradoxalmente, um momento para novos sectores encontrarem as suas oportunidades. E porque em Portugal, nos últimos anos, tem vindo a verificar-se a emergência de novas tipologias de empresas, por vezes dedicadas a áreas antes nunca exploradas no quadro da internacionalização económica, marcadas por formas de modernidade e pela adesão a novas e interessantes propostas tecnológicas, queremos contribuir para lhes proporcionar montras de visibilidade no mercado francês. Essa será sempre a melhor forma de tais unidades, quase sempre mobilizadas por gente jovem e ambiciosa, poderem vir a garantir a hipótese de conquista de lugares de futuro no novo tecido de relacionamento económico que vai acabar por afirmar-se no pós-crise.

Falar de novos investimentos, num quadro de recessão, pode parecer uma ideia despropositada nos dias que correm. Mas todos temos de perceber que um país como a França, com uma economia potencial sempre de grande pujança à escala global, mantém uma linha estratégica de afirmação económica externa que tende sempre a ver muito para além da conjuntura.

No passado, Portugal foi um espaço interessante para algum investimento francês, da mesma forma que esses mesmos capitais se revelaram - e continuam a revelar – um factor importante para o nosso próprio tecido económico. É do interesse oficial português continuar o diálogo com os grandes grupos franceses, bem como com PME’s de certos sectores com vocação externa, com vista a sublinhar as vantagens comparativas que o mercado português, como campo de investimento, continuará a proporcionar. Quem já lá actua desenha, aliás, o nosso melhor cartão de visita.

Uma palavra especial para o turismo. Os últimos tempos vinham a definir um interesse crescente da França pelo mercado português, um mercado que é competitivo no preço, acolhedor na oferta e com uma variedade que tem muito a ver com as profundas ligações culturais e de civilização que nos aproximam. Procuraremos que essa tendência se não perca.

Em todas as áreas, em suma, vamos tentar responder à crise com mais trabalho, mais imaginação e maior diversidade de propostas. E o embaixador de Portugal está à plena disposição dos agentes económicos – portugueses ou franceses – para os ajudar a encontrar os melhores caminhos para a concretização dos seus interesses.

6 de fevereiro de 2009

Mensagem à Comunidade Portuguesa

Ao assumir as funções como novo embaixador português em França, quero começar por referir que considero um privilégio poder servir o Estado português junto de um país com tão antigas e profundas relações com Portugal.


Em diversos mas sempre complexos tempos, muitos milhares de Portugueses encontraram na França o destino amigo que lhes atenuou as dificuldades da vida e, em muitos casos, lhes proporcionou o espaço de liberdade de que careciam. Essa é uma dívida de gratidão que todos temos para com a França e que foi e tem vindo a ser paga com a honestidade e seriedade do trabalho de muitas centenas de milhar de Portugueses que, com grande lealdade, contribuiram e continuam a contribuir para o progresso deste país.


A França é, além disso, a indiscutível matriz cultural de referência de muitas gerações portuguesas, entre as quais a minha, e connosco encontra-se empenhada no reforço do projecto europeu, no qual assentam muitas das esperanças num futuro global de prosperidade e estabilidade. Devemos sempre ter presente que ambos os paises – Portugal e França - somos orgulhosamente tributários de uma comum herança europeia, onde se inscrevem os valores da liberdade, da tolerância e da paz.


Portugal e França partilham também, nos dias que correm, uma importante interdependência económica, com um vasto tecido empresarial que actua em ambos os países, servido por profissionais altamente qualificados, que muito têm contribuído para ajudar a densificar essa mesma relação. Nos tempos nada fáceis da presente conjuntura económica, a sustentação e o reforço desse relacionamento revela-se um elemento essencial para um desenvolvimento assente no bem-estar e no progresso, que concilie as exigencias da competitividade com o inalienavel respeito pelas conquistas do modelo social europeu.


Mas é essencialmente à Comunidade portuguesa e luso-descendente em França que eu gostaria de deixar uma palavra muito especial. Essa Comunidade é a realidade pujante e dinâmica que melhor consubstancia o futuro da ligação entre os nossos países, fruto da sua crescente e prestigiada afirmação nos domínios económicos, culturais e políticos da sociedade francesa. Gostava que soubessem que podem contar comigo, em tudo quanto considerarem útil para a realização dos seus interesses individuais ou colectivos, na busca de uma cada vez maior dignificação da magnifica herança portuguesa neste país.


A todos, em geral, gostava finalmente de recordar que os departamentos do Estado português em França, por cuja orientação sou responsável, são estruturas de serviço público destinadas a procurar satisfazer os seus legítimos interesses e anseios. Por essa razão, quero deixar claro que todos poderão contar com o embaixador de Portugal como um interlocutor aberto, atento e dialogante, disposto a ser o seu provedor junto dos poderes públicos em Portugal e, da mesma forma, um permanente garante da integralidade dos seus direitos junto das autoridades francesas.

2 de fevereiro de 2009

L'Europe se doit d'exister!

On dit qu’il n’y a pas une deuxième chance pour créer une première impression. Voilà le défi de l’Europe devant la nouvelle administration américaine, pour ce qui est du cas de Guantanamo.


Partout dans le monde, l’utilisation de Guantanamo comme prison après le 11 septembre a été lue comme une erreur fatale pour la crédibilité des États-Unis d’Amérique, en tant que pouvoir démocratique, respectueux des Droits de l’Homme. L’annonce faite par le président Obama de son intention de mettre fin à ce centre de détention a soulevé un chorus d’approbation et a démontré que la nouvelle administration à Washington n’était pas indifférente à l’opinion publique mondiale.


Néanmoins, dès le début il est devenu très clair que la mise en œuvre de cette mesure n’était pas sans difficultés. Le statut de certains détenus face à la loi américaine, et devant le cours politique de leurs pays d’origine, soulevait des problèmes très importants. L’aide internationale pour les surmonter s’imposait dès lors.


Le ministre portugais des affaires étrangères, Luis Amado, a annoncé que le Portugal était prêt à faire sa part et à considérer la possibilité de recevoir certains d’entre les anciens prisonniers de Guantanamo, sous quelques conditions et, bien sûr, dans le cadre d’un effort européen collectif.


Cette volonté représentait un geste de solidarité naturelle avec notre partenaire de l’autre côté de l’Atlantique, en particulier au moment où un nouvel agenda stratégique entre l’Amérique et l’Europe se dessine comme possible et désirable.


A notre avis, soutenir les États-Unis dans cet effort pour s’éloigner des erreurs d’un passé récent, qu’on a tous refusé et critiqué vigoureusement, devrait être une priorité pour une Europe qui souligne fréquemment son attachement, soit aux valeurs de l’État de droit soit à l’importance du lien transatlantique pour sa propre sécurité. On n’est pas partenaire parce qu’on le dit: il faut en faire la preuve chaque fois qu’il s’avère nécessaire.


On n’ignore pas les difficultés juridiques et logistiques devant nous pour mettre en œuvre cette opération. Mais il est évident que l’Union Européenne a tous les moyens nécessaires pour la mener à bon terme, si elle le veut. Le cas des réfugiés palestiniens de l’église de la Nativité, en 2002, est là pour le prouver.


Mon gouvernent a noté avec grand intérêt l’approche très constructive du ministre français des affaires étrangères, Bernard Kouchner, sur cette question. En particulier, nous sommes tout-à- fait d’accord avec lui qu’il appartient aux américains de clarifier leurs intentions pour créer les bases pratiques susceptibles de faciliter la tâche européenne.


Le dernier Conseil des ministres des Affaires Étrangères de l'Union a entamé une discussion sur le thème, bien qu'il n’ait pris aucune décision concrète susceptible de conduire cette affaire à bon port.


Pour ce qui nous concerne, la question reste sur la table. Nous continuons à penser que l'Union Européenne doit affirmer une volonté politique à la hauteur de ses ambitions. Il serait en effet très regrettable que l'Union soit perçue de l'extérieur comme un club cacophonique toujours prêt à accuser les autres de fuir leurs responsabilités multilatérales, mais en même temps cachée en permanence derrière ses sensibilités nationales.