São apenas os homens que constroem as cidades? Ou as cidades também fazem os homens? A atribuição da medalha de ouro do Município de Vila Real ao engº Humberto Cardoso de Carvalho, nestas festas da cidade, colocou-me a interrogação.
Um jovem engenheiro, recém-formado, chegou, nos inícios dos anos 50, a uma isolada cidade de província, como era então Vila Real. Trazia consigo vontade de trabalhar e o dinamismo culto de uma família portuense que tinha andado por outros mundos. A facilidade do relacionamento ligou-o, de imediato, às instituições locais. E, muito, às pessoas. Casou pela cidade.
E a cidade logo chamou por ele. Para a presidência da Câmara municipal. Aí fez obra que, no essencial, ainda hoje, décadas depois, se tornou uma marca identitária da terra. O mercado municipal ainda é o mesmo. O Diogo Cão também. A avenida, dita “marginal”, aí está, connosco a não imaginar a cidade sem ela. E tantas, tantas outras realizações, que, um dia, valerá a pena destacar em conjunto, para se medir melhor a coerência de um projecto de dedicação cívica. E outras coisas, que não fez mas que aventou, antes de ninguém, como o túnel do Marão.
Na cidade, pode dizer-se que esteve em tudo. No circuito automóvel, que impulsionou. E também nos bombeiros, a que deu um apoio essencial. Claro está, no Sport Clube, que ajudou a sobreviver. Solidário, colaborou na Misericórdia. Com naturalidade, teve a fraternidade do Rotary no seu percurso. E muitas coisas mais.
Um dia, seduzido pela ideia de que o país podia dar um salto de liberdade, num tempo de conformismo, aceitou ser deputado. Não daqueles que desaparecem nas brumas de Lisboa, mas de quantos regressavam à terra, às pessoas, todas as semanas. Veio Abril e a cidade foi outra. Foi-lhe outra, por um tempo. Mas a cidade, a que importa, teve também teve a dignidade de se comportar como pessoa de bem. E, com serenidade, viu-o regressar ao que sempre fez, e bem, com um rigor impoluto e incontestado.
Para sempre, ficou pela cidade, já sua. E que agora lhe agradece, com o simbólico ouro da edilidade. Nada mais justo e nada mais natural.
Afinal, se são os homens quem faz as cidades, as cidades devem mostrar que sabem retribuir, que são elas que ajudam a construir os homens, colocando-os na sua história. Os que as merecem, claro.
(artigo publicado em "A Voz de Trás-os-Montes", em 14.7.11)
Sem comentários:
Enviar um comentário